
O presidente Jair Bolsonaro foi alertado por militares do governo de
que sua participação no ato deste domingo, 19, convocado para defender o
fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, pegou mal e
expôs as Forças Armadas a uma situação constrangedora. Não foi só:
Bolsonaro também recebeu recados da cúpula do Supremo sobre o perigo da
escalada autoritária no País e advertências sobre leitura política que
sinais emitidos por ele têm provocado.
Na saída do Palácio da Alvorada, na manhã desta segunda, o presidente
tentou, então, culpar a imprensa por vincular sua participação no ato
que pediu intervenção militar no País e pregou a “deposição” de
governadores. Sob aplausos , ele perguntou aos jornalistas: “Onde vocês
estão com a cabeça? Falta um pouco de inteligência para aqueles que me
acusam de ser ditatorial”.
Bolsonaro disse que não poderia conspirar contra ele próprio. “O
pessoal geralmente conspira para chegar ao poder. Eu já estou no poder.
Então, eu estou conspirando contra quem, meu Deus do céu? Eu sou,
realmente, a Constituição”, afirmou ele.
Apesar das declarações e até mesmo de interromper um seguidor para
dizer que “aqui não tem essa conversa de fechar nada” – ao contrário do
que fez neste domingo, quando se calou diante de pedidos de volta da
ditadura e de um novo AI-5 –, Bolsonaro deu uma estocada indireta no
presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). “O meu time não trabalha de
madrugada. O meu time não trabalha à luz do dia”, afirmou o presidente,
convencido de que Maia age para derrubá-lo.
Na prática, o comando do Congresso e integrantes do Supremo avaliam,
nos bastidores, que não há mais conciliação possível com Bolsonaro. Para
políticos e magistrados ouvidos pelo Estado, a pandemia do novo
coronavírus deixou evidente que o presidente age sem consultar as
instituições e não respeita nem mesmo recomendações da Organização
Mundial da Saúde (OMS). Foi por isso que o Supremo decidiu, por exemplo,
que Estados e municípios têm autonomia para decretar o isolamento
social.
Os militares do governo, por sua vez, receberam com alívio o passo
atrás dado pelo presidente, nesta segunda-feira, 20. Até aqui havia
muito desconforto com o fato de ele ter participado da manifestação do
domingo diante do QG do Exército.
Para generais consultados pelo Estado, Bolsonaro muitas vezes é mal
interpretado por não ter o dom da palavra. Embora condene a forma como o
presidente se expressa, o núcleo militar do governo avalia que ele é
movido por um “ideal patriótico” e jamais desrespeitaria a Constituição.
Na avaliação dessa ala, Bolsonaro reage com agressividade por se
sentir injustiçado. O presidente sempre se queixa com militares com quem
convive nunca ter havido uma oposição assim a um inquilino do Palácio
do Planalto.
Estadão